quinta-feira, 26 de março de 2009

A Doutrina da Salvação – Parte 6


Estudamos, anteriormente, a PERSEVERANÇA e a PRESERVAÇÃO DOS SANTOS, mostrando que as pessoas regeneradas perseveram na fé e buscam a santidade do coração e o amor ao próximo.
Agora, prosseguindo no Estudo da Doutrina da Salvação, vamos ver os obstáculos que o homem enfrenta para vir a Cristo, em função de sua natureza corrompida.
Jo 6:44 — Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer.
Ou seja, homem natural é incapaz de "ir a Cristo". Essa afirmação é dura de se aceitar, até mesmo para as milhares de pessoas que dizem ser cristãs, isto é, para nós, os crentes...
E isso acontece porque, de maneira geral, as pessoas têm uma grande dificuldade em compreender o terrível estrago que a queda do homem provocou.
E, o que é pior, as pessoas NÃO se dão contam da "chaga" (ferida) que existe nos seus próprios corações, conforme referido em 1 Rs 8:38.
Com toda certeza, reparem, se o Espírito Santo já tivesse despertado essas pessoas do sono da morte espiritual em que elas se encontram, lhes tivesse permitido ver alguma coisa do pavoroso estado em que estão, por natureza, e lhes tivesse feito sentir que suas "mentes carnais" são “inimizade contra Deus” (Rm. 8:7), aí SIM, elas NÃO mais discordariam dessa solene palavra de Cristo > Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer.
Todavia, aquele que está espiritualmente morto NÃO pode ver, nem pode sentir espiritualmente. Onde, então, reside, ou está, essa total incapacidade do homem natural?
Ela NÃO está na falta das faculdades intelectuais necessárias. Isso tem de ser bastante enfatizado, do contrário o homem caído deixaria de ser uma criatura responsável, passaria a ser como um animal que age por instinto.
Mesmo que os efeitos da QUEDA tenham sido terríveis, eles NÃO privaram o homem de nenhuma das faculdades que Deus originalmente lhe concedeu.
É verdade que o pecado tirou do homem a capacidade de utilizar essas faculdades corretamente, ou seja, empregar essas faculdades para a glória do Criador. Entretanto, o homem caído possui ainda a mesma natureza, o mesmo corpo, a mesma alma e espírito, que tinha antes da Queda.
Nenhuma parte do ser do homem foi aniquilada, foi extinta, ainda que cada uma dessas partes do homem tenha sido contaminada e corrompida pelo pecado.
De fato, o homem morreu espiritualmente, mas a morte não é a extinção do ser (aniquilação) — morte espiritual significa a alienação de Deus, ou como está em Ef 4:18 — obscurecidos de entendimento, alheios à vida de Deus por causa da ignorância em que vivem, pela dureza do seu coração.
Aquele que é espiritualmente morto está, no entanto, bem vivo e ativo no serviço de Satanás.
A incapacidade do homem caído (não-regenerado) de vir a Cristo não reside, portanto, em nenhum defeito físico ou mental.
O ser humano tem o mesmo pé para levá-lo, tanto a um local onde o Evangelho é pregado, como para caminhar até um bar, ou uma casa de prostituição.
O homem possui os mesmos olhos que podem lhe servir para ler, tanto as Escrituras Sagradas, como os jornais, ou uma revista pornográfica.
Ele tem os mesmos lábios, a mesma voz, para clamar a Deus, os quais usa agora em conversas fiadas, em fofocas, ou em canções ridículas, que não louvam ao Deus Criador.
Assim, também, o homem possui as mesmas faculdades mentais para meditar sobre as coisas de Deus e sobre a eternidade, as quais ele utiliza tão diligentemente nos seus próprios negócios.
É por causa disso que o homem é "indesculpável". É, portanto, o mau uso das faculdades que o Criador lhe concedeu que aumenta ainda mais a sua culpa.
Assim, é preciso que cada servo de Deus veja que essas coisas pesam constantemente sobre as pessoas que ouvem a nossa pregação e não se convertem.
E, agora, eu repito a pergunta > Onde está, então, a incapacidade do homem natural?
Em 1º lugar - A incapacidade do homem está na sua natureza corrompida.
Entretanto, isso é muito simplista. Nós temos que ir bem mais a fundo, se quisermos encontrar a fonte da incapacidade do homem.
Reparem, devido à queda de Adão, e por causa do nosso próprio pecado, a nossa natureza se tornou tão corrompida, tão depravada, que é impossível para qualquer homem "vir a Cristo", amá-LO e serví-LO, estimá-LO mais que tudo neste mundo e submeter-se a Ele, até que o Espírito de Deus o regenere e implante nele uma nova natureza.
A fonte amarga não pode jorrar água doce, nem a árvore má pode produzir bons frutos. Vamos explicar isso melhor através de uma ilustração >
É da natureza de um urubu alimentar-se de carniça; no entanto, ele tem os mesmos órgãos e membros que lhe permitiriam comer grãos, como fazem as galinhas.
Entretanto, o urubu não possui, nem a disposição, nem o apetite para se alimentar de milho, por exemplo.
É também da natureza do porco chafurdar na lama. E apesar do porco ter pernas, como uma ovelha, para levá-lo ao pasto verdejante, lhe falta, entretanto, o desejo de comer ervas verdes.
O mesmo acontece com o homem não-regenerado. Ele tem as mesmas faculdades físicas e mentais que o homem regenerado possui para empregar no serviço e nas coisas de Deus, mas NÃO TEM amor por Deus.
Gn. 5:3 registra que Adão — Viveu cento e trinta anos, e gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem, e lhe chamou Sete.
Reparem que terrível contraste existe aqui, com o que lemos dois versículos antes, no v.1 — Deus criou o homem, à semelhança de Deus o fez.
No intervalo entre esses dois versos, o homem caiu, pecou, desobedeceu. E um pai caído, pecador, desobediente, só pode gerar um filho caído, pecador, desobediente, transmitindo-lhe a sua própria depravação.
Jó 14:4 diz — Quem da imundícia poderá tirar coisa pura? — Por isso nós encontramos o salmista declarando, no Sl. 51:5 — Eu nasci na iniqüidade, e em pecado me concebeu minha mãe.
No entanto, apesar de, por natureza, Davi ser um monte de iniquidade e pecado (como também somos todos nós), mais tarde a graça do Senhor fez dele um homem segundo o coração de Deus.
É, então, o caso de se perguntar > Desde que idade essa corrupção da natureza aparece nas crianças? Pv. 20:11 — Até a criança se dá a conhecer pelas suas obras.
Desde o nascimento. A corrupção do coração da criança logo se manifesta: orgulho, vontade própria, vaidade, mentira, aversão ao que é bom, são frutos amargos que logo cedo brotam no novo, mas corrupto, ramo.
Em 2º lugar - A incapacidade do homem está na completa escuridão em que se encontra a sua mente.
Essa importante faculdade da alma, o nosso intelecto, foi destituída da sua glória original, e coberta de confusão. Tanto a mente como a consciência estão corrompidas.
É por isso que Rm. 3:11 diz — não há quem entenda, não há quem busque a Deus.
O apóstolo Paulo, solenemente, lembra aos santos, ou seja os separados, os regenerados, dizendo em Ef. 5:8 — Pois outrora éreis trevas.
Ou seja, não somente os santos estavam "em trevas", mas eram as próprias "trevas". O pecado fechou as janelas da alma, e a escuridão se estende por toda a vida do homem. É a região das trevas e da sombra da morte, onde a luz é como a escuridão.
É ali que reina o príncipe das trevas, onde não se pratica nada além das obras das trevas. Nós nascemos espiritualmente cegos, e não podemos ter essa visão restaurada sem um milagre da graça restauradora de Deus.
Esse é o caso de quem quer que seja, que ainda não nasceu de novo. É como nos diz Jr. 4:22 — São filhos sábios para o mal, e não sabem fazer o bem.
Em Rm. 8:7 Paulo afirma — O pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei de Deus, nem mesmo pode estar.
Existe no homem natural, não regenerado, uma oposição e uma aversão pelas coisas espirituais. Deus revelou a Sua vontade aos pecadores sobre o caminho da salvação, entretanto eles não seguiram esse caminho.
Os homens sabem que somente Cristo é capaz de salvar suas almas, no entanto eles se recusam a se separar das coisas que atrapalham o seu caminho até Deus.
Os homens ouvem que é o pecado que mata a alma, no entanto afagam o pecado em seu peito... Eles não dão ouvidos às ameaças de Deus.
Os homens podem até acreditar que o fogo do inferno vai consumi-los, podem até ficar em grande tormento para evitar isso; entretanto, mostram com suas ações que consideram as chamas eternas como se fossem um mero espantalho. Isto é, algo que a Bíblia diz apenas para causar medo.
O mandamento divino é "santo, justo e bom", mas o homem o odeia, e só observa os mandamentos de Deus quanto a sua respeitabilidade é promovida na sociedade... É o homem que se faz passar por bom, caridoso, verdadeiro, honesto...
Mas continua sendo mau, egoísta, mentiroso, desonesto e corrupto > Um exemplo são os políticos...
Em 3º lugar - A incapacidade do homem está na corrupção dos seus sentimentos.
O homem, no estado em que se encontra, antes de receber a graça de Deus, ama tudo e qualquer coisa que NÃO seja espiritual.
Se quisermos uma prova disso, basta olharmos ao nosso redor. Não há necessidade de nenhum monumento à depravação dos sentimentos humanos.
Olhemos por toda parte. Não existe uma rua, uma casa, e não somente isso, nenhum coração, que não possua uma triste evidência dessa terrível verdade.
Por que, no Dia do Senhor, ou seja, aos domingos, as pessoas não são encontradas congregando-se na casa de Deus? Por que não nos achamos mais freqüentemente lendo nossas Bíblias?
O que acontece para que a oração seja um dever quase que totalmente negligenciado? Por que Jesus Cristo é tão pouco amado?
Por que até mesmo os seguidores professos de Jesus são tão frios em seus sentimentos para com o Senhor? De onde procedem essas coisas?
Seguramente, amados irmãos, nós não podemos atribuir esses comportamentos a outra fonte, QUE NÃO SEJA a corrupção e a perversão dos sentimentos.
Nós amamos o que deveríamos odiar, e odiamos o que deveríamos amar. Não é outra coisa senão a natureza humana caída que nos faz amar esta vida mais do que a vida futura ao lado de Jesus.
Esse é um efeito da Queda > o fato do homem amar o pecado mais que a justiça, amar os caminhos do mundo mais que os caminhos de Deus.
Os sentimentos do homem não regenerado, não nascido de novo, são totalmente depravados e desordenados. Jr. 17:9 diz assim — Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto.
O Senhor Jesus afirmou solenemente que os sentimentos do homem caído (não regenerado) são a fonte de toda abominação. Em Mc. 7:21,22, Jesus diz — Porque de dentro do coração do homem, é que procedem os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios, a avareza, a malícia, o dolo, a lascívia, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura.
Ou seja, os sentimentos do homem natural estão miseravelmente deformados, e podemos até afirmar que o homem natural é um monstro espiritual.
O seu coração se encontra onde deveriam estar os seus pés, seguro ao chão; seus calcanhares estão levantados contra os Céus, onde deveria estar posto o seu coração (At. 9:5).
A face do homem natural está voltada para o inferno. Por isso Deus o chama para se converter. Ele se alegra com o que deveria entristecê-lo, e se entristece com o que deveria alegrá-lo; se gloria com a vergonha, e se envergonha da sua glória; abomina o que deveria desejar, e deseja o que deveria abominar (Pv. 2:13-15).
Em 4º lugar - Sua incapacidade está na total perversão da sua vontade.
"O homem pode ser salvo se ele quiser", diz o arminiano. Mas nós, reformados e crentes em Jesus e na Bíblia, respondemos, "Meu amigo, nós todos cremos nisso; mas essa é que é a dificuldade — se ele quiser."
Nós afirmamos que nenhum homem deseja vir a Cristo por sua própria vontade. E não somos nós que estamos dizendo isso, mas o próprio Senhor Jesus Cristo é quem declara, conforme está em Jo. 5:40 — Contudo não quereis vir a mim para terdes vida...
E, enquanto esse "não quereis vir" estiver registrado nas Escrituras, nós NÃO podemos ser levados a crer em nenhuma doutrina do livre arbítrio.
É estranho como as pessoas, quando falam sobre livre arbítrio, falam de uma coisa de que nada compreendem. Um diz — Ora, eu creio que o homem pode ser salvo ser ele quiser.
Mas, reparem, essa não é toda a questão. O problema é > Será que o homem está naturalmente disposto a se submeter aos termos do Evangelho de Cristo?
Afirmamos, com autoridade bíblica, que a vontade humana é tão desesperadamente dada ao engano, tão depravada, e tão inclinada para tudo que é mau, e tão avessa a tudo aquilo que é bom, que sem a poderosa, sobrenatural e irresistível influência do Espírito Santo, nenhum homem nunca será constrangido a buscar a Cristo.
Como escreveu Thomas Boston, “existe uma corda de três pontas contra o céu e a santidade, que não é fácil de ser rompida; um homem cego, uma vontade pervertida, e um sentimento desordenado. A mente, inchada pela vaidade, diz que o homem não deve se humilhar; a vontade, inimiga da vontade de Deus, diz: ele não quer; as emoções corrompidas, levantando-se contra o Senhor, em defesa da vontade corrompida diz: ele não irá. Assim a pobre criatura permanece irredutível contra Deus, até o dia que, pelo poder da graça, o eleito é feito nova criatura”.
Pode ser que algumas pessoas sejam inclinadas a dizer: — Pastor, ensinamentos como estes desencorajam os pecadores e os levam ao desespero.
Nossa resposta é > Primeiro, esses ensinamentos estão de acordo com a Palavra de Deus! Segundo, esperamos que o Senhor se agrade em usar essas verdades para levar alguns a desesperarem-se de qualquer ajuda que possam encontrar neles mesmos.
Terceiro, esse ensino manifesta a absoluta necessidade da obra do Espírito Santo nessas criaturas depravadas e espiritualmente impotentes, se algum dia vierem salvificamente a Cristo.
Então, até que isso seja claramente entendido, o auxílio de Deus nunca será realmente buscado pelo homem totalmente corrupto.
Amém.